11 de maio, 2018
Mais de 400 cidades pactuaram no Compacto dos Prefeitos com medidas para mitigar os efeitos das mudanças climáticas.
Em Paris, durante a Conferência das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas (COP 21), em 2015, os países também caminharam nesse sentido.
Agora, chegou a hora de agir, e cidades pelo mundo enfrentam um desafio em comum: como financiar projetos sustentáveis que ajudem a cumprir esses objetivos?
Nesse contexto de mobilização mundial, uma das alternativas com grande potencial é a utilização dos títulos verdes (comumente chamados, inclusive no Brasil, pelo termo em inglês green bonds).
Eles são muito parecidos com títulos de dívida comuns, com a diferença essencial de que só podem ser usados para financiar investimentos considerados sustentáveis – como infraestrutura de energia limpa e renovável, transporte verde e projetos capazes de reduzir emissões e o consumo de água, energia e matérias-primas.
É como uma promessa entre quem emite o título – pode ser uma empresa ou um governo – e quem investe nele.
Quando um investidor compra um título verde, ele está emprestando dinheiro por um período de tempo definido.
Esse dinheiro é usado no projeto e retorna ao investidor com juros.
É uma alternativa de investimento a longo prazo que contribui para o futuro do planeta.
Esses papéis têm potencial de movimentar U$ 100 trilhões, segundo uma estimativa realizada pela Climate Bonds Initiative, organização inglesa sem fins lucrativos.
Na pesquisa, também foi considerada a demanda por esses títulos, sempre maior do que a oferta.
O mercado de títulos verdes decolou em 2014, com US$ 36,6 bilhões emitidos, o triplo do montante emitido em 2013 (US$ 11 bilhões).
O ano de 2015 fechou com a emissão de US$ 41,8 trilhões.
O Brasil ainda não tem regulamentação para a emissão desses títulos verdes.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), do Ministério da Fazenda, afirma que acompanha as discussões sobre o assunto, mas que não estabelece nenhum prazo para que uma regulamentação aconteça.
Em entrevista recente ao jornal O Globo, o secretário de Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente, Carlos Klink, afirmou que os green bonds são tema recorrente no ministério, e que também está “na Fazenda, no BNDES, na Febraban (Federação Brasileira dos Bancos)”.
Klink também informou que a emissão de debêntures (títulos de dívida) é outro tema de debate.
Em abril, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) firmou um acordo com a GIZ (agência de cooperação do governo alemão que oferece soluções sustentáveis em processos de mudanças econômicas, sociais e políticas) e com o SEB (banco sueco envolvido com o financiamento da transição para uma economia verde) para ampliar esse debate no país.
“Não temos dúvidas de que os green bonds têm grande potencial. Esse novo mercado está experimentando ganhos substanciais em volume de negócios e alocação de capital no mundo todo. Os recursos destinados para a transição para uma economia verde serão cruciais para viabilizar soluções de baixo carbono em escala”, comentou Marina Grossi, presidente do CEBDS, após o acerto.
A entidade acredita que, apesar da crise do país, esse é um bom momento para começar a preparar as empresas para a futura emissão desses títulos e quebrar as resistências, pois quando a economia voltar a crescer o mercado estará pronto.
(Foto: Mariana Gil / WRI Brasil Cidades Sustentáveis)
Até o momento, a única empresa brasileira a emitir esse tipo de título é a BRF, que mantém marcas como Sadia e Perdigão.
A empresa ofereceu 500 milhões de euros ao mercado europeu para financiar práticas mais sustentáveis.
A procura foi quatro vezes maior do que o valor disponível.
Porém, para estados e municípios, os nós são mais complexos de destravar.
Desde a década de 1990, quando foi regulamentada a Lei de Responsabilidade Fiscal, eles estão proibidos de lançar títulos de qualquer tipo.
São Paulo e Rio de Janeiro já tentaram flexibilizações com o Ministério da Fazenda, sem sucesso.
Já o Governo Federal pode, por meio da dívida pública, pedir ao Tesouro Nacional que emita títulos e pegue dinheiro emprestado de investidores para honrar compromissos.
Pelo mundo, governos e cidades também fazem parte do crescimento dos green bonds como alternativa de financiamento.
Sabe-se que as cidades ocupam 2% do território mundial, mas emitem 70% dos gases do efeito estufa.
E elas são particularmente mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas.
Portanto, investimentos nos grandes centros contribuem para reduzir emissões, mas também para torná-los mais resilientes, o que ajuda a salvar vidas.
Pelo mundo, a participação de títulos emitidos por cidades têm crescido com o passar dos anos:
Mas mudar a legislação não é o único desafio.
A alta taxa de juros brasileira e os custos de transação também são obstáculos.
Outro custo adicional é que, para serem considerados projetos verdes, eles precisam ser avaliados por agentes externos, o que se chama de second opinion – eles atestam se os projetos são de fato sustentáveis.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), em estudo recente, levantou seis motivos para a dificuldade de desenvolvimento dos títulos verdes no Brasil:
1. Os títulos públicos estão em patamar muito diferente dos corporativos;
2. A baixa liquidez do mercado secundário no Brasil prejudica o desenvolvimento do mercado de títulos privados;
3. O mercado de investidores é concentrado e há baixa participação de investidores pessoas físicas e estrangeiros;
4. O processo de colocação de green bonds no mercado é extenso e possui um custo adicional (second opinion);
5. Falta de incentivo para o underwriter estruturar um green bond em detrimento de uma debênture tradicional;
6. Investidores percebem maior risco associado aos green bonds no caso de financiamento de um projeto de tecnologia nova.
Destravar esse tipo de financiamento para cidades brasileiras poderia ser uma forma de torna-las cada vez mais sustentáveis em menos tempo.
Afinal, tempo é um recurso escasso.
Para cumprir as metas acordadas em Paris, capazes de manter o aquecimento global em menos de 1,5°C, a hora de agir é agora.