16 de novembro, 2015
Pietro Rocha e Marcos Delgado, os dois sócios da Tribo Viva, investem na iniciativa há quatro meses.
Ideais inovadoras podem surgir na mesa de um bar, no meio de uma viagem e até em uma festa de casamento. A Tribo Viva, plataforma de consumo colaborativo de orgânicos, nasceu na igreja onde o chef Pietro Rocha, 40, se casou, em Porto Alegre, há três anos. Logo após a cerimônia, Pietro conheceu o publicitário Marcos Delgado, 37, amigo de sua mulher, a jornalista Maísa. Logo os dois se tornaram amigos inseparáveis — e descobriram que tinham muito em comum. Ambos cultivam o hábito da alimentação natural, compram alimentos orgânicos e, talvez ainda mais importante, têm o desejo de mudar a sociedade e incentivar novas formas de consumo, baseadas no compartilhamento.
Depois de passar uma longa temporada na Europa, comandando a cozinha de vários restaurantes, Pietro percebeu que cada vez crescia mais a tendência de comprar alimentos preferencialmente de produtores locais de alimentos orgânicos. “Lá fora, os orgânicos já são consumidos há muito tempo e não têm o preço alto cobrado aqui pelos supermercados”, diz ele. Ao voltar para o Brasil, em 2011, Pietro começou a sentir falta dessa cultura dos produtos naturais a preços mais acessíveis. Ao mesmo tempo, Marcos se ressentia de tocar um trabalho que, para ele, incentiva o consumismo:
“As pessoas precisam reaprender a se colocar como cidadãos, e não como uma massa que só compra, indiscriminadamente”
Não demorou muito para os dois amigos partirem para a ação. Marcos deixou a sociedade na agência de publicidade que mantinha em Porto Alegre e Pietro abraçou a causa de criar um meio de oferecer orgânicos sem intermediários, de produtores rurais com práticas saudáveis, em um raio de até 100 quilômetros de Porto Alegre, para que os alimentos chegassem frescos à cidade.
MAIS DO QUE VENDER, FALAR SOBRE O ASSUNTO
Para validar a ideia, que ambos consideravam bastante disruptiva, os empreendedores criaram um blog para falar não apenas sobre alimentação saudável e orgânicos, mas também consumo compartilhado e cidadania. Eles também escreveram um guia online sobre onde comprar alimentos sem agrotóxicos em Porto Alegre. “A receptividade foi muito boa e resolvemos lançar a empresa”, diz Pietro.
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As cestas da Tribo Viva (como esta, acima) são oferecidas no site, que informa a
quantidade disponível, a já comprada e o prazo de validade da oferta.
Os números de mercado estão a favor da Tribo Viva. Segundo o Projeto Organics Brasil, programa de incentivo à agricultura orgânica, em 2014 o mercado de orgânicos movimentou 2 bilhões de reais. Este ano, a previsão é que atinja 2,5 bilhões de reais. Nos próximos anos, a venda de alimentos produzidos sem agrotóxicos deve crescer até 40%. “Principalmente em regiões como o Sul e Sudeste tem havido uma estruturação da cadeia produtiva, com bom resultado nas vendas, em boa parte pela tendência em se buscar alimentos menos processados e mais saudáveis”, diz Ming Liu, coordenador executivo do Projeto Organics Brasil.
Através da Tribo Viva, criada há quatro meses, já estão sendo vendidas de 300 a 400 cestas de orgânicos por mês. As verduras, legumes e frutas são fornecidos por quatro produtores da região de Porto Alegre. Marcos e Pietro fazem um trabalho de curadoria dos fornecedores: eles visitam os produtores e checam os alimentos. Aqueles que passam no crivo da dupla ganham o direito de vender seus produtos na plataforma.
Geralmente, são cestas com alimentos como arroz integral, rúcula, laranja, banana, batata e mandioca, em quantidades que dão para uma semana. “O preço médio, de 40 reais pela feira da semana, é bem menor do que o dos supermercados”, diz Marcos. Os empreendedores cobram uma taxa 10% a 20% sobre o valor da cesta – e só. Para comprar as cestas, basta se cadastrar no site.
UMA REDE DE DISTRIBUIÇÃO SEM DISTRIBUIDOR
Os custos de logística são divididos pelos próprios integrantes da plataforma, que funciona como uma comunidade. Não há a figura do distribuidor. Um membro do grupo se oferece para receber os produtos, entregues no endereço escolhido pela pessoa, e a dividi-los em cestas, segundo a quantidade informada no site. Em troca, esse coordenador voluntário ganha a cesta da semana. Tudo acontece dentro de casa mesmo. A compra é realizada pelo site e os compradores se encontram no dia e horário combinado na casa do voluntário a entregar as cestas. “Muitas vezes, surge até uma amizade entre as pessoas. Em geral, são grupos pequenos, de 10 ou 15 pessoas”, conta Marcos.
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Plantio de mudas no assentamento Mulheres da Terra, um dos principais fornecedores
da Tribo Viva, gerenciado por mulheres agricultoras de orgânicos.
Para garantir a segurança dos integrantes da rede, o endereço da entrega só é revelado para quem efetuou o pagamento na plataforma. “Além de eliminar a figura do intermediário e permitir que se cobre preços mais baixos, o sistema possibilita que as pessoas se conheçam e troquem ideias”, diz Pietro. Quem preferir, pode contratar um serviço de entrega de bicicleta, pago pelo cliente. “Nós só indicamos a ecobike”, diz Pietro.
Agora, um dos maiores desafios da dupla é ganhar escalabilidade, ou seja, replicar o modelo de negócios para conseguir aumentar o volume de vendas e o faturamento. A expectativa de Pietro e Marcos é conseguir mais 16 fornecedores até o final deste ano, todos localizados próximos a Porto Alegre. Os empreendedores querem incentivar produtores locais que não utilizam agrotóxicos e praticam a agricultura sustentável, com uso inteligente de recursos naturais e pagamento justo pelo trabalho dos funcionários. Hoje, um dos principais fornecedores da Tribo Viva é o grupo Mulheres da Terra, formado por agricultoras que participaram de um programa de assentamento para sem terras em Viamão, próximo a Porto Alegre.
Para aumentar a rede e cadastrar mais produtores, Marcos e Pietro têm andado pela Serra Gaúcha e o Vale do Caí, onde têm fincado raízes as plantações de orgânicos. Faz parte dos planos deles expandir a Tribo Viva para o centro-oeste e capitais do Sul, como Curitiba. “Para isso, o primordial é encontrarmos bons produtores, que certamente existem”, diz Pietro: “O modelo de negócios é bastante inovador, mas a aceitação tem sido grande”. Planta que dá.
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Via DRAFT