16 de março, 2019
“Poderíamos ‘tirar da geladeira’ o projeto da patente que tínhamos depositado em 2012 e que pouco tinha evoluído em quatro anos”, conta o sócio-fundador do Instituto Cidade Jardim.
Em 2017, a startup teve aprovado o projeto de desenvolvimento de um sistema de telha cultivável que dispensa impermeabilização e, agora, com a ajuda do programa PIPE/PAPPE Subvenção,resultado de acordo de cooperação entre a FAPESP e a Financiadora de Inovação e Pesquisa (Finep), espera apresentá-la ao mercado no primeiro semestre deste ano.
O Instituto Cidade Jardim especializou-se na pesquisa, produção e difusão de telhados verdes desde que foi fundado, há 10 anos, pelo agrônomo Rocha, juntamente com a ecóloga Fabiana Scarda. A empresa tem entre seus clientes desde residências até grandes empreendimentos, como o Condomínio Ilha Pura (Vila dos Atletas), no Rio de Janeiro, e o Hospital da Restinga, de Porto Alegre.
“No ano passado, plantamos 200 m² de trigo sobre a cobertura do projeto vencedor da mostra Casa Cor São Paulo 2018, em parceria com o Studio Arthur Casas (arquitetura) e Renata Tilli Paisagismo – dois dos escritórios mais renomados do país”, destaca Rocha.
O crescimento dos negócios, contudo, esbarrava em um obstáculo: as características técnicas do modelo convencional de telhados verdes. “Atendemos centenas de clientes potenciais que nos procuram de forma recorrente para instalar telhados verdes, mas desistem quando descobrem a dificuldade para a adequação da estrutura de madeiramento e telhas de barro (ou cimento), que dominam esse segmento da construção civil”, relata o agrônomo. “A telha cultivável é um produto que nasceu a partir de uma demanda reprimida”, afirma.
Rocha explica que as tradicionais telhas de barro são pesadas (cerca de 70 kg/m²) e, por isso, inadequadas para receber sobrecarga estática extra. Assim, para aplicar um telhado verde sobre edificações com esse tipo de cobertura é necessário retirar todas as telhas, regularizar a base da estrutura e aplicar uma membrana de impermeabilização.
“Esse é um entrave para a popularização da tecnologia no mundo todo. Como nosso produto é muito mais leve do que uma telha de barro convencional (10 kg/m² quando seco e 35 kg/m² saturado de água, podendo variar conforme a vegetação), a conversão será basicamente trocar uma telha por outra, agora verde”, garante o empresário.
No entanto, o orçamento de microempresa não deixava espaço para investir no aprimoramento do projeto e na produção em escala. Os recursos aportados pelo programa PIPE/PAPPE Subvenção trouxeram a ajuda que faltava.
Inspirado na natureza
Para o desenvolvimento do telhado verde, o pesquisador partiu de um produto já existente e aceito pelo mercado – telhas térmicas tipo sanduíche, com recheio de isopor ou poliuretano. Essa base foi adaptada para incorporar um sistema de cultivo de plantas concebido de acordo com os princípios da Biomimética (design de materiais, estruturas e sistemas inspirados em elementos e processos biológicos).
“Desenvolvemos um produto que imita o funcionamento de um tecido vivo natural, como as folhas de uma planta”, diz o pesquisador. Segundo Rocha, o núcleo de poliuretano foi redesenhado de forma a permitir a passagem de mangueiras de gotejamento e a distribuição da água internamente, por capilaridade, em toda a superfície, num processo semelhante ao do floema e xilema de uma planta (tecidos vegetais responsáveis pela condução de seiva).
“Na superfície externa das telhas, criamos orifícios que simulam os estômatos (aberturas microscópicas existentes na epiderme das plantas), onde inserimos sementes e mudas para o cultivo. O sistema de encaixe e parafusamento sobre estruturas metálicas ou de madeira garante a estanqueidade sem a necessidade de aplicação de membrana impermeabilizante”, detalha.
Na chamada “Telha Sanduíche Cultivável”, como foi denominado o novo produto, o cultivo de plantas ornamentais ou alimentícias será feito por hidroponia e o controle de irrigação e adubação será automatizado. O Instituto Cidade Jardim firmou parceria com a Faculdade de Engenharia de Sorocaba (Facens) para o desenvolvimento de um aplicativo de IoT (internet das coisas), para notebook ou smartphone, que fará o monitoramento da necessidade de água e nutrientes, a partir de sensores instalados próximos à raiz das plantas.
Também foram firmadas parcerias no exterior para o aprimoramento e a realização de testes do produto. Segundo o pesquisador, os resultados são animadores. “Nossos protótipos apresentaram resultados positivos em todos os testes de cultivo realizados no Brasil, na Itália [em parceria com a Universidade de Bolonha] e na Alemanha [em parceria com o Centro de Excelência em Telhados Verdes de Neubrandemburg]”, afirma o pesquisador.
“Os painéis também foram aprovados pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) no que se refere à sua estanqueidade e resistência estrutural. A telha hidropônica não vaza, suporta pisoteio para manutenção, é resistente a impactos e possibilita o cultivo com sucesso de telhados verdes extensivos [com plantas ornamentais de forração de baixa manutenção] e agricultura urbana [com manutenção intensiva]”, ele diz.
Economia de água e energia
Segundo Rocha, a promoção da agricultura urbana em telhados é um dos principais objetivos do Instituto Cidade Jardim. “Na sede do instituto, em Itu (SP), temos uma área demonstrativa de cultivo de grãos e horticultura de subsistência. Plantamos de uvas de mesa e morangos a uma grande variedade de verduras, legumes, tubérculos, temperos e plantas medicinais, tudo em cima do telhado.”
Mas o projeto também prevê outras contribuições voltadas à sustentabilidade das metrópoles. Com a popularização dos telhados verdes, o Instituto Cidade Jardim espera colaborar na gestão de recursos como energia elétrica e água.
De acordo com o agrônomo, a telha cultivável reduz a temperatura do ambiente, reduzindo a necessidade de climatização artificial. “Grandes estruturas como shopping centers e galpões industriais, com alto consumo de energia elétrica com climatização, tendem a se beneficiar com reduções na ordem de 7% na conta de energia elétrica”, estima o pesquisador.
“Os atuais sistemas de telhado verde não competem no mercado global de telhas e coberturas. Eles são revestimentos complementares, ou seja, configuram um item a mais no orçamento. O que queremos com essa inovação é simplificar, dar a opção para que o cliente possa instalar um telhado verde como se instala uma telha convencional”, afirma o empresário.
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