Juntamente com voluntários, a carioca Clarice Rohde levantou uma casa de 24 metros quadrados em duas semanas. Erguida no Laboratório de Modelos 3D da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, esta é primeira WikiHouse da América Latina – modelo construtivo que disponibiliza pela internet plantas arquitetônicas de código aberto (open source) concebidas para imóveis a serem montados por qualquer leigo, em um sistema de encaixe de placas de compensado de madeira.
“Vejo isso como uma reverberação do esforço de empoderamento das pessoas, do faça-você-mesmo”, diz o arquiteto Thiago José de Barros, do Estúdio Guanabara, escritório de arquitetura que estuda o barateamento da WikiHouse original (inglesa) para o Brasil. “Aqui, o preço do compensado encarece a proposta”, explica. Uma alternativa seria incorporar outros materiais formando um sistema híbrido. Além dos convencionais, como tijolo, poderiam ser prensados resíduos usados numa parceria com indústrias, tudo de pasta de dentre, por exemplo.
O interessante, ressalta o arquiteto André Daemon, também do Estúdio Guanabara, é que na escolha do material se aproveite o que tem disponível na região. Para baratear os custos e incentivar o uso do sistema pela comunidade, moradores poderiam comprar coletivamente a máquina CNC (que faz o corte das placas) para uso compartilhado.
Rohde, que acaba de se formar, também abrasileirou sua Wiki. Após estudar as plantas disponíveis no site da WikiHouse Foundation, ela desenvolveu a sua versão, acrescentando varanda (pensando em pendurar redes), beiral (proteger da chuva), telhado inclinado, além de aspectos sustentáveis de climatização (janelas estrategicamente posicionadas para refrescar o ambiente). Ou seja, o modelo não limita as possibilidades dos arquitetos.
Outros caminhos
Esta e outras propostas indicam um repensar das moradias tradicionais, em termos de materiais, tamanho, modelo de negócio: casas minúsculas, contêineres modulares, edifícios com escritórios compartilhados, materiais ecológicos.
Além das novas tecnologias, para o bioarquiteto Francisco Lima, esse repensar tem muito a ver com a questão do consumo exacerbado. “As pessoas vão adquirindo mais consciência do todo e se perguntam: eu realmente preciso disso tudo? Qual é minha real necessidade para ser feliz?”
Do ponto de vista ambiental, o questionamento é positivo, considerando o alto impacto da construção civil para o planeta. Moradias menores, menos impactos. Recorrer a materiais naturais também ajuda.
Segundo Lima, a procura por bambu, madeira e pedra aumentou nos últimos anos, bem como a propagação da bioarquitetura (calcada na saúde do morador e na sustentabilidade), mas sua aplicação ainda é ínfima comparada aos métodos convencionais.
Na internet pipocam fotos de estrangeiros que moram em contêineres marítimos reaproveitados. O tamanho mínimo indicado para residências é de 30 metros quadrados, entretanto é possível criar espaços maiores e incluir outros recursos, como o vidro. No Brasil, estados como Paraná e Rio de Janeiro têm hotéis do gênero, mas poucas moradias. Uma das razões é a falta de financiamento imobiliário, na avaliação de Tatiana Bookman, da Delta Conteiners, empresa paranaense que vende a estrutura. É que os bancos não consideram contêiner como habitação, embora ela acredite que isso deva mudar com o aumento dos interessados.
A vantagem maior é a praticidade. Adaptar um espaço de 200 metros quadrados leva quatro meses, com possibilidade mínima de atraso, já que a execução envolve pouquíssimos profissionais e não é paralisada por chuvas. Se a família crescer, dá para acoplar outro módulo na vertical; se mudar de endereço, encaixota-se tudo para transportar num caminhão.
Para Barros, a capacitação de mão-de-obra não acompanha o ritmo de evolução da construção civil, restringindo-se aos métodos tradicionais. “Aí ficamos refém do concreto, de materiais sujos, molhados e de grande desperdício”, lamenta.
Via Página 22 – por Elaine Carvalho