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Leonardo DiCaprio, ecoturismo e Blackadore Caye: Um novo padrão para edifícios verdes

01 de fevereiro, 2016

Em abril de 2015, o New York Times publicou uma matéria sobre a recente compra de Blackadore Caye – uma pequena ilha na costa de Belize que passou por significante degradação ambiental e erosão – porLeonardo DiCaprio. Patrono de uma série de projetos ambientais, DiCaprio se associou a Paul Scialla, CEO da plataforma imobiliária Delos, para criar um eco-resort que pretende ser um modelo de última geração em termos de empreendimento turístico ambientalmente responsável. Os planos do empreendimento incluem construir uma série de acomodações flutuantes para hóspedes, 48 villas privadas (que variam de 5 a 15 milhões de dólares), equipamentos para saúde e bem estar, além de uma área de conservação. O projeto está sendo divulgado como um empreendimento que atende às ambiciosas normas de construção verde e padrões sustentáveis do Living Building Challenge e do WELL Building Standard®.

Muitos leitores da Revista Times ironicamente notaram na seção de comentários que os jatos privados, o envio de materiais de construção e os recursos diários para o desenvolvimento da ilha traz consigo altos custos ambientais e sociais que superam em muito os esforços de conservação associados ao resort. Por outro lado, alguns dos que comentaram na reportagem apontaram que o desenvolvimento vai empregar mão de obra local e salvar a ilha de completa degradação. A discussão em torno dos prós e contras do empreendimento de ‘eco-turismo’ não é algo novo, e certamente não é algo que será facilmente resolvido.

Mas além da (importante) discussão dos impactos do eco-turismo, o empreendimento levanta questões sobre o surgimento de um novo padrão de mercado alternativo de edifícios sustentáveis, que propositalmente objetivam transformar a indústria da construção, definindo metas mensuráveis para os efeitos ambientais e sociais dos locais que vivemos e trabalhamos.

 

Talvez o mais famoso das certificações de sustentabilidade, LEED®, foi introduzido pelo US Green Building Council em 2000 e desde então tem ganhado força significante nos mercados imobiliários ao redor do mundo. Desde o desenvolvimento de LEED®, padrões similares como o Living Building Challenge, desenvolvido pelo International Living Future Institute (ILFI), e o WELL Building Standard®(WELL), fundado pelo Instituto Delos e inaugurado em 2014, sem dúvida representam abordagens ainda mais ambiciosas para mudar positivamente o ambiente construído. Por exemplo, o Living Building Challenge é um padrão ambicioso e louvável que incentiva projetos para criar mais energia do que consomem, eliminar a dependência de serviços públicos de água distrital, e estimular comunidades justas e inclusivas.

O objetivo destes padrões e certificações é nobre – criar espaços e edifícios mais saudáveis que focam nas pessoas e sociedade que são destinadas a servir. No entanto, o movimento dos padrões de edifícios verdes atualmente se encontra vulnerável ao mesmo tipo de síndrome do arquiteto-celebridade que é dominante na arquitetura mainstream, e que muitas vezes resulta em projetos desconexos que pecam na falta de um senso de responsabilidade social ou comunitária. O objetivo de etiquetagens como o WELL é melhorar a saúde humana e ambiental de uma comunidade, e ainda sim, neste momento, o benefício destas certificações parece focar apenas naqueles que podem pagar por isso. Por exemplo, entre os projetos certificados de WELL está o edifício residencial e comercial 66 East 11th St em Manhattan com unidades que superam os $14 millhões de dólares e as unidades de apartamentos já incluem proprietários membros do Conselho administrativo da Delos, como Leonardo DiCaprio e o guru holístico Dr. Deepak Chopra. Entre os campeões de vendas de WELL parece haver uma falta de auto-consciência, que até agora o apelo à uma maior saúde e bem-estar está em grande parte sendo retratado como algo reservado aos ricos. Neste momento, a riqueza parece comprar a saúde.

Vista aérea do projeto de McLennan oara Blackadore Caye. Imagem © McLennan Design via The New York Times

Vista aérea do projeto de McLennan oara Blackadore Caye. Imagem © McLennan Design via The New York Times

“Existem questões fundamentais que nos perguntamos a cada projeto,” declara Jason McLennan, fundador da ILFI, membro do conselho da Delos e um dos arquitetos responsáveis do projeto de Blackadore Caye project: “Este edifício a ser construído vale a pena ser protegido? Quando inaugurado, vai fazer a vida das pessoas melhor? Será que vai inspirar-nos a ser pessoas melhores?”

Quando aplicamos este critério em projetos como o Blackadore Caye, é difícil ver como um resort de eco-turismo para os ultra-ricos está melhorando a vida das pessoas de maneira significante do que apenas restaurar a ilha como uma reserva educacional e uma fundação, ou como está inaugurando um nicho de mercado da indústria do turismo que já explorou o eco-turismo em muitos níveis de sucesso. É um desafio lidar com a forma como vários padrões sustentáveis podem justificar os gastos de energia e materiais necessários para os projetos que apenas se destinam à uma porção extremamente pequena e privilegiada da população. Muitos destes resorts costeiros nem sequer cumprem tecnicamente como projetos completos de Living Building Challenge, já que um dos primeiros requisitos obrigatórios proíbe empreendimentos dentro de 15 metros de zonas úmidas ou dentro de planícies de inundação de 100 anos.

Algumas das casas privadas que irão compor o projeto em Blackadore Caye. As casas estariam avaliadas entre $5 milhões e $15 milhões. Imagem © McLennan Design via The New York Times

Algumas das casas privadas que irão compor o projeto em Blackadore Caye. As casas estariam avaliadas entre $5 milhões e $15 milhões. Imagem © McLennan Design via The New York Times

Se eventualmente o resort for criado, torná-lo “o melhor possível” é desejável. Padrões sustentáveis comuns no mercado, como é o LEED de maneira compreensível recompensa para este tipo de abordagem. Por outro lado, não deveriam as questões de sensibilidade ao ambiente local, tamanho e escala, além de inovação de baixo impacto levam prioridade quando está na vanguarda de projetos sustentáveis?

Em uma entrevista recente, McLennan argumenta que expor celebridades e CEO’s ao projetos progressistas do Resort de Blackadore Caye eventualmente fará com que os custos sejam reduzidos e estenda-se o alcance do projeto sustentável e declara que “nós deveríamos experimentar com os ricos. Deixe-os fazer baixar os custos das coisas.” No entanto, a eficácia de uma teoria trickle-down da arquitetura é infundada hoje em dia. Estariam projetos de alto padrão, por vezes sancionada pelas normas de construção sustentáveis, apenas perpetuando a percepção de que a sustentabilidade é principalmente para os ricos?

Com Blackadore Caye, teria o movimento de edificações sustentáveis oficialmente chegado ao seu ápice e enfrenta agora o declínio? A comunidade defensora dos edifícios sustentáveis constantemente luta com a ideia de não apenas fazer “menos ruim”, mas fazendo melhor”, um conceito popularizado por William McDonough e Michael Braungart em Cradle to Cradle  (2002) e adotado como o objetivo essencial da Living Building Challenge. Neste exemplo, o que resultaria no maior bem para a ilha – definindo-o de lado para a conservação, ou a construção de um desproporcionado resort de luxo? Se a meta de construção de normas, como a certificação WELL é promover e reconhecer impactos positivos saúde ambiental e humana, parece que eles se desviaram com Blackadore Caye. No entanto, o status de celebridade do projeto poderia torná-lo o garoto-propaganda das próprias normas que critica.

Tanya Mejia, LEED AP BD+C, é especialista de sustentabilidade pela Perkins Eastman, onde desenvolve programas de sustentabilidade, gestiona os padrões do mercado de sustentabilidade e trabalha com equipes de projeto para maximizar os valores sócio, econômica e ambientalmente. Sua experiência anterior inclui muitos anos na GBCI como parte do Departamento de Certificação LEED.

Archdaily

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