Há mais de dois meses em chamas, a Terra Indígena Arariboia, que abriga o povo Guajajara e um grupo de índios isolados Awá-Guajá, é palco de um drama de dimensões gigantescas. O fogo consumiu quase a metade do território e já atingiu algumas aldeias
Um dos maiores incêndios florestais dentro de uma terra indígena já registrados no Brasil está consumindo um dos últimos remanescentes de floresta amazônica do Maranhão e ameaçando a sobrevivência de povos indígenas, incluindo grupos isolados. A Terra Indígena (TI) Arariboia, de 413 mil hectares, já teve mais de 45% de seu território transformado em cinzas, apesar do trabalho incessante de 250 homens que atuam para conter uma linha de fogo que chegou a ter 100 quilômetros de extensão.
A TI é a casa de 12 mil pessoas da etnia Guajajara e de cerca de 80 índios isolados do povo Awá-Guajá. Em sobrevoo realizado pelo Greenpeace no dia 24 de outubro sobre os principais focos de calor da TI Arariboia foi possível verificar o avanço do fogo sobre as aldeias e sobre as áreas de floresta densa que se localizam no coração do território, onde vivem os Awá Guajá, que estão cercados pelas chamas. O incêndio florestal já consumiu cerca de 190 mil dos 413 mil hectares que constituem a TI, o equivalente a cerca de 190 mil campos de futebol.
Acompanhada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a convite de lideranças Guajajara, a equipe do Greenpeace também esteve por terra dentro da TI Arariboia e pôde avaliar melhor o tamanho do estrago produzido pelo incêndio. “Foi chocante constatar a dimensão gigantesca da destruição e perceber que os Guajajara e Awá-Guajá são as grandes vítimas dessa tragédia”, afirma Danicley de Aguiar, da Campanha da Amazônia do Greenpeace. “Além da erradicação do fogo, a maior preocupação é garantir a sobrevivência desses povos. Muitas roças foram destruídas e o acesso à caça deve ficar comprometido, por isso os índios poderão ter sérias dificuldades para conseguir alimentos. Depois que o fogo for controlado, será necessário que o governo acompanhe de perto essa situação”, completa ele.
Em meio à forte fumaça que tomava conta da aeronave, Sonia Guajajara, liderança da Apib e moradora da TI Arariboia, observava incrédula o incêndio pela janela do avião: “O que vai ser do meu povo, a vida não vai ser fácil, vamos sofrer muito sem nossa floresta”, disse ela. Segundo Sônia, os Guajajara identificaram os focos de incêndio logo no início do mês de setembro e, por meio de alguns brigadistas indígenas, informaram os coordenadores das brigadas do Prevfogo, braço do Ibama especializado na prevenção e combate incêndios, na região. “Não é aceitável que os órgãos competentes, como a Funai e o Ibama, não tenham percebido o aumento dos focos de incêndio dentro da terra e tenham demorado tanto para tomar as providências necessárias para combater o fogo que se espalhava pelas aldeias”, complementou Sônia.
Os brigadistas indígenas, chamados “guardiões”, estão na vanguarda das iniciativas de proteção do território Guajajara. Desde o início do incêndio, eles se apresentaram aos órgãos do estado como uma força auxiliar para o combate, mas foram rejeitados pelo Ibama sob o argumento de que não teriam experiência de combate a incêndios e não faziam parte das brigadas do programa Prevfogo.
Madeireiros estão sendo acusados pela propagação do fogo, que seria uma represália às ações de monitoramento autônomo do território realizadas pelos índios para impedir a extração de madeira ilegal. Junto com outras terras indígenas do Maranhão, a Arariboia sofre com a invasão e o roubo de madeira de maneira sistemática. A falta de uma política eficaz de proteção das terras indígenas permite que isso aconteça e aumenta o risco de incêndios como esses: a degradação causada pela atividade madeireira ilegal torna a floresta vulnerável ao fogo.
Em outubro, o Governo do Maranhão declarou situação de emergência em 11 terras indígenas no estado. Além da Araribóia a situação se estende às terras indígenas Geralda Toco Preto, Canabrava Guajajara, Governador, Krikati, Lagoa Comprida, Bacurizinho, Urucu, Juruá, Porquinhos e Kanela. Segundo as lideranças indígenas do Maranhão, porém, há registros também de focos de incêndio em outras terras além das citadas no decreto, como é o caso da Alto Turiaçu, do povo Ka’apor.
Com a ajuda de seis soldados do Corpo de Bombeiros do Estado do Maranhão, cerca de 48 índios Guajajara trabalham atualmente na extinção dos focos de incêndio no centro da TI Araribóia. “Mesmo com todas as dificuldades de logística e comunicação, os guardiões têm sido muito efetivos no combate aos focos de calor que ameaçam o povo Awá-Guajá, se confirmando como um exemplo de bravura e solidariedade”, assinala Danicley de Aguiar.
Preocupada com as consequências dessa tragédia social e ambiental, Sônia Guajajara clama por maior integração entre os órgãos de Estado responsáveis por extinguir o incêndio na Terra Indígena. “Não há espaço para falhas, pois estas podem significar a destruição de toda a floresta e assim comprometer a vida dos povos Guajajara e Awá-Guajá. “Não vamos abrir mão de defender nossas florestas e nossos irmãos” conclui ela.
Fonte: Greenpeace Brasil